Reportagem da Revista Veja:
Segundo uma
pesquisa, a crença em mandingas é uma forma de superar situações em que nos
sentimos fora do controle. Quanto mais passos e repetições o ritual tiver, mais
as pessoas creem neles.
Juliana Santos
As simpatias fazem
parte da vida da maioria dos brasileiros. Vestir-se de branco na noite de
Réveillon, colocar um vaso de sete ervas em casa, tomar banho de sal grosso e
amarrar fitinhas no braço são alguns dos exemplos mais conhecidos.
O brasileiro André
Souza, pós-doutorando em psicologia na Universidade do Texas, nos Estados
Unidos, sempre achou curiosas as receitas de sua mãe para diversas situações
cotidianas – se quisesse passar em uma prova, por exemplo, ele deveria dormir
com o livro aberto e vestir uma camisa azul no dia do exame. Por isso, as
mandingas viraram seu objeto de estudo acadêmico.
Souza e a psicóloga
americana Christine Legare iniciaram uma série de pesquisas sobre rituais,
especialmente simpatias. Com experimentos feitos no Brasil e nos Estados
Unidos, a dupla mostrou que os processos cognitivos envolvidos na realização de
um ritual são os mesmos presentes em diversas ações cotidianas – como apertar o
botão do elevador mais vezes quando se está com pressa.
A relação entre as
duas ações está na intuição: em ambos os casos, a pessoa não sabe exatamente
como aquele processo (seja dar três pulinhos ou apertar o botão mais quatro
vezes) vai fazer com que ela atinja seu objetivo, mas intui que alguns fatores,
como a repetição, podem ser responsáveis pelo sucesso da ação.
Segundo o autor,
isso acontece porque quando nosso sistema cognitivo se depara com uma ação e um
resultado que não sabe explicar, é mais fácil se convencer de que deve haver
uma explicação quando vários procedimentos levam ao resultado, mesmo que você
não saiba dizer como isso aconteceu. "O que difere uma ação ritualística
das demais é não saber a relação de causa e efeito. Mas você compensa a falta
de entendimento com processos intuitivos, como repetição e detalhamento",
afirma Souza.
Esse tipo de
intuição funciona para outras situações, além das simpatias. "A gente não
tem uma cognição diferente pra avaliar rituais. Usamos os mesmos processos
cognitivos, e é por isso que os rituais, apesar de terem diferenças
superficiais, em termos cognitivos, são parecidos em qualquer lugar", diz.
Para garantir que
os resultados não eram exclusivos dos brasileiros, acostumados com a tradição
de simpatias, os autores repetiram o teste com 68 americanos. Entre eles, a
quantidade de pessoas que acreditavam nesses rituais foi menor, mas os
resultados se mantiveram iguais, ou seja, os mesmos fatores que fazem a
simpatia parecer eficaz foram apontados pelos americanos, apesar de não haver
equivalência às simpatias brasileiras nos Estados Unidos.
O fato de uma
pessoa acreditar ou não na eficácia das simpatias também não alterou os
resultados. Mesmo entre os participantes que se declararam céticos, a descrença
era maior diante das simpatias com poucos detalhes e menos repetição.
Depois disso, cada
um recebeu algumas simpatias para avaliar. A ideia é que, entrando em contato
com termos que remetem à falta de controle, o sistema cognitivo seria afetado
por essa sensação, de forma inconsciente. De fato, os resultados mostraram que
as pessoas desse grupo avaliaram as simpatias como sendo mais eficazes,
enquanto o resultado dos grupos neutro e negativo foram iguais. Em outras
palavras, quando estamos diante de uma situação que sentimos incapazes de
controlar, temos uma tendência de acreditar em rituais, para compensar essa
falta de controle cognitivo.
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