sábado, 2 de novembro de 2013

OS PADRES DEVEM FICAR LONGE DAS URNAS NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES


A um ano do pleito de 2014, dirigentes católicos orientam sobre impossibilidade de cuidar de paróquias e disputar cargo público

Ainda falta um ano para as próximas eleições, mas os bispos católicos já começaram a orientar seus padres sobre a impossibilidade de concorrer a cargos públicos. Em Apucarana, no Norte do Paraná, o bispo diocesano, dom Celso Antônio Marchiori, emitiu decreto vetando o envolvimento de padres, diáconos e presbíteros com candidaturas em 2014. O texto apenas reforça uma lei que vale para toda a Igreja: o parágrafo 3.º do cânon (artigo) 285 do Código de Direito Canônico, segundo o qual “os clérigos são proibidos de assumir cargos públicos, que implicam participação no exercício do poder civil”.
O decreto esfriou os ânimos de sacerdotes filiados a partidos e cotados, nos bastidores, para trocar o altar pelo palanque. A esses padres coube pedir a desfiliação partidária ou enfrentar a suspensão por quatro anos – o período pelo qual estariam exercendo mandato, eleitos ou não. Um padre suspenso fica impedido de exercer várias atividades, como celebrar missas e ouvir confissões. O retorno à vida pastoral após esse tempo também não é automático – depende da decisão do bispo. Um outro artigo do Direito Canônico, o 287, também proíbe que padres se filiem a partidos políticos ou façam parte da diretoria de sindicados, a não ser em circunstâncias muito específicas.
Análise
A separação entre clero e partidos é necessária, diz especialista
Poder ou dever de se candidatar a um cargo público? Esta é a pergunta que o pós-doutor em Ciência Política Gustavo Biscaia de Lacerda, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), faz sobre a participação de religiosos na política. Para Lacerda, o clero tem capacidade de reunir votos suficientes para ganhar uma eleição, mas nem por isso deve entrar em uma disputa eleitoral. “É necessário separar as coisas. O fato de eles [padres e pastores evangélicos] conhecerem a realidade da comunidade não é mérito. Quem orienta pelo conselho não tem de ter poder de mando; esse poder degrada o poder do aconselhamento”, analisa Lacerda.
Na avaliação do especialista, o decreto emitido pelo bispo de Apucarana deveria ser reproduzido em outras regiões do país. “É uma decisão que deveria ser estendida e incorporada à Lei Eleitoral, para vedar que todos os sacerdotes e pastores [evangélicos] concorressem a cargos públicos”, afirma o especialista.
725 membros de ordens religiosas se candidataram a prefeito ou vereador em 2012, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desse total, 82 foram eleitos – 17 prefeitos e 65 vereadores. No Paraná, de 43 candidatos sacerdotes, dois se tornaram prefeitos e três, vereadores.
Segundo o vigário-geral da Diocese de Apucarana, padre Paulinho Amaral, a medida foi tomada com antecedência para evitar, mais adiante, desgastes em convenções partidárias. No que diz respeito às filiações partidárias, a única exceção aberta pelo decreto de dom Celso é para os padres que deixaram prefeituras neste ano. É o caso dos sacerdotes Osvaldo Campos de Almeida (PTB), ex-prefeito de Borrazópolis, e José Martins de Oliveira (PTB), de Jardim Alegre.
É o próprio dom Celso quem diz que o decreto esclareceu a posição da diocese e que a discussão já está resolvida – sacerdotes que estavam pensando em se candidatar desistiram de tentar a carreira política. Os padres Antônio José Beffa (PHS), atual prefeito de Arapongas, e Hilário Vanjura (PSDB), prefeito de Lunardelli, estão suspensos desde que iniciaram mandato neste ano.
Em outras regiões do estado, os bispos repetem o mesmo discurso de dom Celso. O arcebispo de Maringá, dom Anuar Batistti, lembra que essa decisão não está a critério de cada bispo, mas que se trata de obedecer ao Código de Direito Canônico. “Deixamos claro que aquele sair candidato deve deixar o ministério. Uma coisa não combina com a outra, o partido racha a comunidade”, afirma. Em 2008, o arcebispo de Cascavel, dom Mauro Aparecido dos Santos, também lançou mão de um decreto para vetar a participação de sacerdotes nas eleições. E em Londrina, o arcebispo dom Orlando Brandes também afirma que não deverá haver padres pleiteando cargos públicos em 2014.
Colaborou: Marcio Antonio Campos
Párocos relativizam o Direito Canônico
Embora não haja exceções à proibição da atividade político-partidária por parte dos sacerdotes, alguns bispos e padres ignoram ou relativizam o Direito Canônico para justificar sua participação na política. O vereador e ex-prefeito de Londrina Padre Roque (PR) defende que os padres, sendo pessoas livres, deveriam ter a possibilidade de exercer cargo público. “Fé e vida são coisas que caminham juntas, não uma coisa estagnada”, argumenta.
Ele também afirma que, mesmo afastados de suas funções, os padres continua­rão sempre sendo sacerdotes. Esta condição o fez recorrer à Justiça para garantir o uso da palavra “padre” em seu nome político. “Fiz isso porque em Londrina houve alguns questionamentos quando fui eleito”, conta, ao recordar que, quando assumiu uma cadeira na Câmara, já estava afastado de sua paróquia havia quatro anos.
O ex-prefeito de Borra­­zópolis Osvaldo Cam­­pos de Almeida (PT) diz ter exercido o mandato paralelamente às atividades de padre por oito anos. Durante o dia, ele dava expediente na prefeitura e, à noite, celebrava missas fora da cidade. “Os bispos têm de defender a Igreja, mas dá para conciliar as duas coisas. Na experiência que tive como prefeito, nunca abandonei minha paróquia”, diz.

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