De acordo com o Censo Demográfico 2010, Londrina possui 7,5 mil crianças e adolescentes com idades entre 10 e 19 anos que vivem em lares com renda mensal de até R$ 1.020 -- e, destas, uma parcela considerável, de 1.676 jovens, vivem com renda familiar de até R$ 255 por mês. Hoje, o Município consegue atender a menos da metade delas, 3,1 mil, com atividades de esporte, cultura, lazer e capacitação para o mercado de trabalho nos projetos Viva Vida e Centros de Formação para a Cidadania (CFCs).
A gerente de Garantia de Direitos Sócio Assistencial à Criança e Adolescente e Juventude, da Secretaria Municipal de Assistência Social, psicóloga Adriana da Cruz Barrozo, afirmou que a região norte é a mais desassistida da cidade, principalmente o Residencial Vista Bela, que não conta com nenhum projeto por falta de local.
Em um loteamento, que fica na entrada do Vista Bela, funciona uma extensão do Viva Vida do bairro São Jorge. Lá, são atendidas 50 crianças e adolescente do Vista Bela. “Isso é praticamente nada diante da grande demanda do lugar. O ideal é termos projetos dentro do bairro”, admitiu Adriana.
João Vitor Santos, 17 anos, Jhonatan Nunes, 15 anos, e Willian Gomes, 17 anos, são moradores do Vista Bela e jogavam bola na rua no final da tarde. “Aqui não tem nada. Tem futebol na quadra, mas só para os menores. A gente não pode jogar”, disse o primeiro.
Os garotos gostariam que houvesse atividades esportivas para os jovens da idade deles, mas o que mais querem é que o bairro tenha cursos de capacitação para o mercado de trabalho. “A gente queria coisa mais séria. Esporte é bom, distrai, mas a gente precisa de algo para arrumar serviço”, afirmou João Vitor.
Jhonatan concordou com o amigo. “Aqui não dá para pensar em fazer faculdade. A gente pensa em ter um trabalho e se virar na vida, por isso precisa desses projetos.” Willian também disse sentir falta de cursos de capacitação, mas se mostrou mais esperançoso quanto ao futuro. “É lógico que penso em fazer faculdade. Quero fazer Direito.”
Moradora do bairro desde a criação dele, em 2010, Sandra de Souza, contou que a situação é grave e faz com que muitas crianças e adolescentes fiquem nas ruas, expostas ao tráfico de drogas. Recentemente dois adolescentes foram assassinados no local.
“Precisamos, em primeiro lugar, de um espaço para um centro de convivência, onde possamos fazer cursos e atividades de esporte, lazer e cultura”, afirmou Sandra.
Ela exemplificou que, recentemente, os próprios moradores organizaram uma batalha de hip hop, com atividades da escola de circo, entre outras. “Todos participaram, foi muito bonito de ver. Eles querem, só falta oportunidade. É triste ver que aqui tem muitos talentos, mas sem a possibilidade de serem descobertos.”
Outra moradora, Gislaine Teixeira, 37 anos, também reclamou da falta de oportunidades. “Vemos muitas adolescentes grávidas, adolescentes usados no tráfico, adolescentes que são mortos. Alguns moradores até carpem mato de praça para fazer atividades para atraí-los para algo que os interessem. Mas precisamos é de projetos com continuidade, que sejam realmente interessantes para estas crianças e adolescentes”, afirmou.
“Sem subsídio financeiro, não tem como atraí-los”, defende advogado
Para vencer a concorrência com o tráfico de drogas, o fundador da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), advogado Ariel Castro Alves, defendeu a preparação dos adolescentes para o mercado de trabalho.
“Sem subsídio financeiro, não tem como atraí-los. Eles precisam de sustentabilidade já que não podem nem querem depender dos pais”, disse. “Além disso, são necessárias oportunidades de estágios, aprendizagem, cursos técnicos, empregos, com ações dos órgãos públicos e também da iniciativa privada.”
Alves, que também foi presidente da Fundação Casa, organização municipal de São Bernardo do Campo (SP), que atua na defesa e garantia dos direitos da criança e do adolescente, acrescentou que, entre as ações necessárias, estão a garantia de vagas para os jovens em cursos profissionalizantes, independentemente de escolaridade e com direito a bolsas de estudo pagas pelo poder público.
“Também é necessário criar uma política de incentivos fiscais para as empresas que contratem estagiários e aprendizes, entre os 14 e os 21 anos, principalmente. As prefeituras e empresas públicas também devem contratar esses jovens”, afirmou.
Carência maior entre adolescentes
A carência de atendimento a crianças e adolescentes por projeto de lazer, esporte, cultura e capacitação para o trabalho é maior na região norte, mas também se espalha por toda a Londrina.
Atualmente, a cidade tem dez unidades do Viva Vida, sete Centros de Formação para a Cidadania (CFCs) e outras 16 entidades, conveniadas da Prefeitura, que desenvolvem projetos sociais. A quantidade é pouca, segundo a gerente de Garantia de Direitos Sócio Assistencial à Criança e Adolescente e Juventude, da Secretaria Municipal de Assistência Social, psicóloga Adriana Barrozo. E a oferta é mais escassa para os adolescentes. Do total de 3,1 mil educandos, apenas 30% estão nesta faixa etária.
Além da escassez de projetos para atender a todos, ainda há a dificuldade de adesão. “Eles querem atividades que lhes deem remuneração, aí o tráfico de drogas acaba sendo um concorrente muito forte", disse Adriana.
João Turquino
No bairro João Turquino, na zona oeste, a educadora social do Centro de Formação para a Cidadania (CFC), Maria Malta, concordou. “Vimos muitos adolescentes que passaram por aqui morrer [por causa do tráfico].”
Ela explicou que o foco do CFC é o fortalecimento de vínculos, a convivência familiar e comunitária e a capacitação para o mercado de trabalho.
Nos dois primeiros pilares, já foi possível colher resultados. “Hoje eles se apropriam do espaço e cuidam do lugar e estamos trabalhando bem a convivência e o fortalecimento de vínculos”, afirmou. “Mas emperramos na capacitação para o mercado de trabalho, que é o que os adolescentes mais buscam.”
A coordenadora do CFC, Luísa Kowatsu, afirmou que é preciso repensar o projeto neste ponto para atrair os adolescentes. “Precisamos de laboratórios para fazer parcerias com serviços que deem cursos de capacitação”, disse. “Temos espaço físico, ficamos com salas ociosas que podiam estar equipadas com equipamentos de informática para trazer estes cursos para cá.”
Adriana Barrozo reconheceu a necessidade de rever a metodologia dos projetos e disse que é preciso mais investimentos. (EP)
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