O sonho de ter uma casa no campo (ou na praia) arrasta o desejo de ficar próximo da natureza lá para a frente, sem que a gente se dê conta de que é possível manter essa conexão aqui e agora . Depois de percorrer sete parques nacionais de quatro estados americanos (entre Oregon e Montana) em 20 dias, uma das coisas que mais chamaram a atenção da fotógrafa Cinthia Paranhos não foram as 965 cachoeiras que fotografou. Nem os três ursos pretos que encontrou pelo caminho, os muitos bisões, a centena de focas, a única coruja. E nem o fato de ter feito muitas das partes de seu percurso dirigindo em estradas onde não havia absolutamente nenhum outro automóvel. O que a surpreendeu foi mesmo ver a reação das pessoas diante daquela natureza tão selvagem. A quantidade de gente, de todas nacionalidades, que encontrei por esses parques é impressionante. A euforia das pessoas (me incluo) ao ver um urso, um bisão, uma cabra da montanha, um cervo, em seu estado natural é realmente surreal”, diz ela. “O mundo está muito carente de natureza!” A tecnologia é algo mesmo incrível, sensacional, que nos permitiu muitas conquistas como sociedade. Mas ela nos impede de descobrir coisas que temos que começar a buscar novamente, como o nosso papel no mundo. E isso é mais que passar o dia inteiro com uma tela em frente aos olhos”, explica. Uma conversa ao vivo, ele diz, é muito diferente de uma conversa pela tela, mesmo que ela permita ver a pessoa. “Temos que entender que há coisas que as pessoas fazem melhor do que a tecnologia.” Conectar-se, por exemplo. “Aliás, nos dias de hoje, esse aparelho tem sido uma forma de distanciar cada vez mais nossas relações. Eu ainda sou um cara que vê uma beleza natural na atenção que as pessoas dão umas às outras”, ele diz. O jornalista e autor Richard Louv dedicou seu tempo a entender como as novas gerações estão cada vez mais desconectadas da natureza. Faça um teste: pergunte qual a porcentagem das crianças que você conhece que já viram animais de verdade em seus habitats naturais, e não apenas atrás das grades dos zoológicos? De acordo com um estudo da Kaiser Family Foundation (EUA), as crianças entre 8 e 18 anos passam cerca de 7,5 horas por dia, todos os dias da semana, na frente de uma tela, principalmente, o celular. Louv acredita que elas (e também muitos adultos) sofram do que ele chama de “distúrbio de déficit de natureza”. Esta, fonte de uma menor consciência e de uma reduzida capacidade de encontrar um sentido para a vida. (A Última Criança no Bosque: Salvando Nossas Crianças do Distúrbio de Déficit de Natureza (sem edição no Brasil). De acordo com o autor, há uma correlação fundamental entre saúde, inteligência e natureza. Essas pesquisas revelam que as crianças tendem a ser mais saudáveis, felizes e criativas quando passam algum tempo próximas à natureza. Os efeitos, como era de esperar, também chegam aos adultos. Um estudo realizado pelo pesquisador Marc Berman, no Instituto de Pesquisa de Rotman, em Toronto (Canadá), conseguiu levantar dados que mostram que a interação com a natureza pode ser terapêutica para pessoas com distúrbios, incluindo depressão e ansiedade. Em uma pesquisa com voluntários, os estudiosos perceberam uma melhora na memória e na atenção de mais de 20% depois de uma caminhada em um parque cheio de árvores.
“Temos comprovado cada vez mais os benefícios cognitivos de passar mais tempo em contato com o verde”, diz o professor no estudo. “Mas, ao mesmo tempo, as pessoas passam 25% menos tempo hoje aproveitando a natureza do que passavam há 20 anos.” Isso não significa que é preciso vender tudo e comprar uma casa no campo, como ainda permeia o sonho ideal de tanta gente. Até porque esse desejo intrínseco de largar tudo para trás em troca de uma paz de espírito com passarinhos na janela. Além de árvores frondosas no quintal, horta e, tudo mais que o sonho nos dá direito, é senão um indicativo de que essa paz tão almejada está longe de ser vivenciada, certo?
E você, está pronto para o que está prestes a ver?
RAFAEL TONON é jornalista.
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