sexta-feira, 8 de abril de 2022

RAZÕES PARA ACREDITAR...É BOM MORAR NO CAMPO!

 




O sonho de ter uma casa no campo (ou na praia) arrasta o desejo de ficar próximo da natureza lá para a frente, sem que a gente se dê conta de que é possível manter essa conexão aqui e agora . Depois de percorrer sete parques nacionais de quatro estados americanos (entre Oregon e Montana) em 20 dias, uma das coisas que mais chamaram a atenção da fotógrafa Cinthia Paranhos não foram as 965 cachoeiras que fotografou. Nem os três ursos pretos que encontrou pelo caminho, os muitos bisões, a centena de focas, a única coruja. E nem o fato de ter feito muitas das partes de seu percurso dirigindo em estradas onde não havia absolutamente nenhum outro automóvel. O que a surpreendeu foi mesmo ver a reação das pessoas diante daquela natureza tão selvagem. A quantidade de gente, de todas nacionalidades, que encontrei por esses parques é impressionante. A euforia das pessoas (me incluo) ao ver um urso, um bisão, uma cabra da montanha, um cervo, em seu estado natural é realmente surreal”, diz ela. “O mundo está muito carente de natureza!” A tecnologia é algo mesmo incrível, sensacional, que nos permitiu muitas conquistas como sociedade. Mas ela nos impede de descobrir coisas que temos que começar a buscar novamente, como o nosso papel no mundo. E isso é mais que passar o dia inteiro com uma tela em frente aos olhos”, explica. Uma conversa ao vivo, ele diz, é muito diferente de uma conversa pela tela, mesmo que ela permita ver a pessoa. “Temos que entender que há coisas que as pessoas fazem melhor do que a tecnologia.” Conectar-se, por exemplo. “Aliás, nos dias de hoje, esse aparelho tem sido uma forma de distanciar cada vez mais nossas relações. Eu ainda sou um cara que vê uma beleza natural na atenção que as pessoas dão umas às outras”, ele diz. O jornalista e autor Richard Louv dedicou seu tempo a entender como as novas gerações estão cada vez mais desconectadas da natureza. Faça um teste: pergunte qual a porcentagem das crianças que você conhece que já viram animais de verdade em seus habitats naturais, e não apenas atrás das grades dos zoológicos? De acordo com um estudo da Kaiser Family Foundation (EUA), as crianças entre 8 e 18 anos passam cerca de 7,5 horas por dia, todos os dias da semana, na frente de uma tela, principalmente, o celular. Louv acredita que elas (e também muitos adultos) sofram do que ele chama de “distúrbio de déficit de natureza”. Esta,  fonte de uma menor consciência e de uma reduzida capacidade de encontrar um sentido para a vida.  (A Última Criança no Bosque: Salvando Nossas Crianças do Distúrbio de Déficit de Natureza (sem edição no Brasil). De acordo com o autor, há uma correlação fundamental entre saúde, inteligência e natureza. Essas pesquisas revelam que as crianças tendem a ser mais saudáveis, felizes e criativas quando passam algum tempo próximas à natureza. Os efeitos, como era de esperar, também chegam aos adultos. Um estudo realizado pelo pesquisador Marc Berman, no Instituto de Pesquisa de Rotman, em Toronto (Canadá), conseguiu levantar dados que mostram que a interação com a natureza pode ser terapêutica para pessoas com distúrbios, incluindo depressão e ansiedade. Em uma pesquisa com voluntários, os estudiosos perceberam uma melhora na memória e na atenção de mais de 20% depois de uma caminhada em um parque cheio de árvores.

 

 “Temos comprovado cada vez mais os benefícios cognitivos de passar mais tempo em contato com o verde”, diz o professor no estudo. “Mas, ao mesmo tempo, as pessoas passam 25% menos tempo hoje aproveitando a natureza do que passavam há 20 anos.” Isso não significa que é preciso vender tudo e comprar uma casa no campo, como ainda permeia o sonho ideal de tanta gente. Até porque esse desejo intrínseco de largar tudo para trás em troca de uma paz de espírito com passarinhos na janela. Além de árvores frondosas no quintal, horta e, tudo mais que o sonho nos dá direito, é senão um indicativo de que essa paz tão almejada está longe de ser vivenciada, certo?

O músico e apresentador Daniel Daibem aposentou o carro (um Chevette 1978) ainda na década de 1990 e, de lá para cá, prefere se locomover na cidade com as próprias pernas, como faziam nossos antepassados. Tornou-se um “pedestrianista”, como diz o termo para indicar pessoas que são pedestres por convicção, a caminhar por São Paulo com uma outra visão da cidade. “Isso te coloca naquela condição do antigo caçador-coletor e dá outra sensação de passagem de tempo”, ele acredita. “Assim, a retomada da natureza não fica restrita apenas a entrar em contato com mato, cachoeira, pôr do sol etc. É também readquirir hábitos que tínhamos antes de vivermos nesse modelo de cidade voltado para o sistema ‘carro-apartamento-carro-trabalho-carro-apartamento-carro’. É adotar outra postura perante o ambiente em que se vive, com mais significado, se apropriando da cidade, do lugar em que você está”, diz ele. é o que nos permite enxergar cada ser vivo, objeto ou até mesmo cada ideia em sua intrincada relação conosco. “É o que nos faz enxergar as coisas da forma mais prática e também mais filosófica possível”, afirma Tristan Gooley, navegador que já liderou expedições pelos cinco continentes e que compilou seus pensamentos no livro-pensata How to Con- nectwith Nature (Como se Conectar à Natureza, sem edição em português). É preciso lembrar que esse desejo de estar próximo do verde não é um senso comum – muitas pessoas nem percebem que tem um passarinho cantando na sua na janela ou que a lua está tão clara que é capaz de iluminar o caminho. “Essa é uma visão comum a muitas pessoas que ficariam felizes de ter uma vida mais interessante se pudessem”, ele diz. Nossos ancestrais, por exemplo, deveriam pensar que a discussão sobre autoestima era uma prioridade menor, já que estavam famintos e sofrendo para encontrar abrigo. “Os seres humanos modernos, mais sofisticados, passaram a acreditar que os estágios anteriores e mais na base dessa hierarquia ficaram no passado, que eles têm pouca relevância para a vida presente”, diz.

E você, está pronto para o que está prestes a ver? 

RAFAEL TONON é jornalista.


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