quinta-feira, 28 de julho de 2022

RECORDANDO AS ANTIGAS VENDAS E BOTECOS DE MINAS GERAIS!

 

(Por Arnaldo Silva ao blog do Osvaldo)







(Por Arnaldo Silva) A geração atual convive com grandes hipermercados, lojas de conveniências, bares sofisticados e shoppings. A geração anterior, vivia nos tempos dos antigos armazéns de Secos e Molhados, botequins e vendas de esquina. Embora antigos, são tradicionais e alguns resistem ao tempo e modernidade, estando presentes, mesmo que em menor número, em todas as cidades mineiras, inclusive na capital.

          As mercearias e armazéns tem praticamente o mesmo significado e funcionavam no mesmo lugar. Os armazéns surgiram em Minas Gerais, nos tempos do Brasil Colônia. Era um espaço amplo, onde eram armazenados produtos secos e molhados, para serem vendidos nas mercearias. Eram os armazéns que abasteciam as mercearias e em sua maioria, os armazéns também eram mercearias.(na foto acima de Fabinho Augusto, uma antiga e tradicional que existiu em Barro Branco, distrito de Ponte Nova MG, até bem pouco tempo)
As mercearias e armazéns

          No significado geral, mercearia era uma loja para venda das especiarias, bebidas, gêneros alimentícios e miudezas de uso doméstico, que ficavam armazenadas nos armazéns, garantindo assim estoque. As construções eram divididas. A frente era a mercearia e os fundos, o armazém, onde os estoques eram guardados. (na foto acima de Elpídio Justino de Andrade, um desses tradicionais armazéns, que também eram mercearias. É o Armazém 2 Irmãos, datado de 1854, em Faria Lemos MG, Zona da Mata)
          Eram lojas formais, presentes nos grandes distritos e cidades, que vendiam seus produtos em suas mercearias, bem como, para outras mercearias. Os armazéns eram comércios atacadistas e varejistas.
          Compravam e vendiam produtos oriundos das fazendas como feijão, arroz, manteiga, banha, fumo, palha para cigarro, linguiça, carnes, leite, doces, queijos, etc., e principalmente, de necessidades básicas que não eram fabricados nas cidades onde estavam estabelecidos, como sal, querosene, tecidos, linhas, agulhas, lamparinas, panelas, penicos, baldes, ferramentas, roupas, sapatos, chapéus, etc. Esses produtos chegavam às cidades pelos tropeiros ou mesmo, em carros de bois. Eram viagens longas, que levavam meses.

          Não existia na época remédios em cápsulas ou comprimidos. Eram medicamentos líquidos e colocados em vidros. No Brasil Colônia, as boticas eram levadas pelos mascates e tropeiros em carroças e carros de bois, cortando as estradas do nosso sertão. (na foto acima de Thelmo Lins, uma tradicional venda em Virginópolis MG)
          Com o crescimento dos povoados e cidades, foram surgindo lugares próprios para a venda desses remédios nas cidades, que passou a se chamar boticas. Sãos as antigas boticas, as precursoras das farmácias, de hoje.
          As boticas foram inspiração para surgir lugares para a venda de bebidas, não para curar as mazelas do povo, mas para vender as bebidas típicas das localidades em garrafas, como cachaça, vinhos, licores. Tempos depois, começaram a servir petiscos, como chouriço, linguiça, mandioca, torresmos, etc.
                           
As vendinhas de esquinas         
          Já as vendas, mais populares e mais comuns que os botecos e armazéns, são um pouco dos dois. Surgiam aos montes nas esquinas das vilas e cidades e geralmente, faziam parte da casa dos donos. Os nomes das vendas eram geralmente associados aos nomes ou apelidos dos seus donos. Vendiam tudo o que era vendido nos armazéns, bem como, tudo que era vendidos nos botecos, por isso eram chamadas de vendas.
          Embora cada dono de venda, organizava seu estabelecimento conforme o espaço que tinha, as vendas era bem parecidas. Eram de esquina, com 2, 3 ou 4 portas na frente, sem janelas, com estantes em madeira nas paredes, onde ficavam as bebidas e vários produtos e miudezas. Um balcão de madeira com vidro, onde ficavam as guloseimas.  Caixotes, onde eram colocados os produtos a granel, como feijão e arroz. Balança com pesos comparativos, sobre o balcão. Tinham algumas vendas com balanças mais modernas para a época, como a Filizola. (na foto acima e abaixo de Arnaldo Silva, a Venda da Emília, no Arraial do Conto em Cordisburgo MG, região Central)
          Sobre o balcão das vendas, nunca faltava baleiros, além de um monte de miudezas penduradas no teto e um rádio de pilha, sintonizado na rádio AM da cidade. Em algumas vendas tinha até radiolas e gravadores rodando fitas k-7, para os fregueses. Tinha também uns tamboretes e mesas rústicas, onde os amigos sentavam para prosear e tomar umas pingas e comer uns tira gostos caseiros. (na foto abaixo, de Arnaldo Silva, a Venda da Emília)
          Mesmo com o espaço pequeno das vendas, nelas, cabia de tudo e dificilmente não se encontrava o que se procurava. Desde linha, agulha, carne de sol, discos de vinil, réstia de alho, xarope de groselha, colcha de chenile, fitas k-7, salame, bucha, fumo de rolo, manivela para pipa, vara de pescar, anzol, bacalhau, prego, bolinhas de gude, ratoeira, enxada, açúcar, ki-suco, picolé, pilhas para rádio, lâmpadas, arroz e feijão vendidos em granel, brinquedos, pratos, canecas, carrinho de mão, bules, raticidas, naftalina, gaiolas, doces, balas, sapatos, shampoo, banha de porco, lápis, borracha, linguiça, sal, querosene, lamparina, marmelada, baldes, trempe para fogão a lenha, esmalte, tachos de cobre, maria-chiquinha, sabão, pasta de dente, leite, queijo, farinha, fubá, panelas, penico, bacias, pão de sal, Folha Mariana, tabuada, café moído na cara do freguês e em algumas vendas, o café era também coado na cara do freguês, se ele preferisse. Era tudo bem embrulhado. (foto abaixo de Arnaldo Silva)
A caderneta
          Poucas pessoas pagavam na hora. Tudo anotado numa caderneta, item por item. No início do mês, o freguês ia lá, sem falta, e pagava. A confiança e honestidade eram valiosos e todos faziam questão de honrar seus compromissos, com os donos das vendas. Ninguém se preocupava em vender fiado, sabiam que todos pagavam.
Ponto de encontro de amigos e famílias
          As vendas eram lugares para todos da família. Tinha de tudo para todos até para as crianças. Os baleiros eram o encanto da infância, tinha todas as balas que a criançada adorava. Dentro do balcão tinha tantas guloseimas, que os meninos, ao olharem, ficavam com os olhos brilhando. (na  foto acima do Amauri Lima, a Venda e Mercearia do Israel São João Batista do Glória MG)
          As mulheres encontravam nas vendas utilidades para seu dia a dia, bem como para os cuidados da casa. Já os homens, eram os grandes frequentadores das vendas, isso porque, além de ter tudo o que precisavam para seu dia a dia, tinha também as pingas e os amigos, frequentadores da venda. Além da pinga, em algumas vendas, serviam tira gostos de torresmo com mandioca e os populares pão com salame e pão com linguiça frita. O que não faltava nas vendas era o xarope de groselha. Adoravam misturar pinga com groselha. 
Diferença de vendas antigas e mercados atuais
          As fotos acima retratam bem como eram bem organizadas, pitorescas, nostálgicas e aconchegante as vendas antigas. Dá vontade de chegar e ficar. (na foto abaixo do Deocleciano Mundim, o Bar do Baiano, local que serviu por muito tempo como rodoviária da cidade de Lagoa Formosa MG, Alto Paranaíba)
          Diferente de hoje, com os mercados e grandes mercados, você entra, coloca tudo num carrinho, paga e vai embora. As vendas, eram lugares de amigos. Mesmo para comprar um ou dois itens, chegando nas vendas, demorava para sair. Sempre encontrava-se amigos, parentes e conversas rendia, enquanto o tempo passava. Mas ninguém ligava, não existia a correria do dia-a-dia de hoje.
          Isso porque o bom de estar numa venda, é conversar com o dono e sua família e com os amigos, compadres e comadres, que lá estavam. O ambiente era totalmente familiar e os frequentadores, eram chamados de fregueses.
 

Nas vendas, nem precisavam de dinheiro, bastava uma simples caderneta onde eram anotadas as compras dos fregueses. Quem era freguês de uma determinada venda, dificilmente comprava em outra. Isso porque, além de serem fregueses, mantinham laços de amizades, afinidades e respeito ao dono da venda, sendo esse o segredo da boa freguesia. 
 Ainda existem
          Apesar das facilidades e conforto da modernidade, em pleno século XXI, em muitas cidades mineiras, muitas das tradicionais vendas e antigos armazéns, ainda resistem ao tempo, da mesma forma que antes, sem nada mudar e ainda, vendendo fiado, com tudo anotado nas cadernetas. (na foto acima Luiz Fernando, a tradicional venda Venda Alto Minchillo em Guaranésia MG)
         

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