quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

POETA, CARL0S DRUMMOND DE ANDRADE , GRANDE SAUDADE!

 

Escultura em bronze, Carlos Drummond, Av Atlantica - Rio de Janeiro


AMAR         

                                         - Carlos Drummond de Andrade



Que pode uma criatura senão,

entre criaturas, amar?

amar e esquecer,

amar e malamar,

amar, desamar, amar?

sempre, e até de olhos vidrados, amar?



Que pode, pergunto, o ser amoroso,

sozinho, em rotação universal, senão

rodar também, e amar?

amar o que o mar traz à praia,

o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?



Amar solenemente as palmas do deserto,

o que é entrega ou adoração expectante,

e amar o inóspito, o áspero,

um vaso sem flor, um chão de ferro,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho, 

e uma ave de rapina.



Este o nosso destino: amor sem conta,

distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,

doação ilimitada a uma completa ingratidão,

e na concha vazia do amor a procura medrosa,

paciente, de mais e mais amor.



Amar a nossa falta mesma de amor, e na

secura nossa

amar a água implícita, e o beijo tácito, e a

sede infinita.




_______________________________________________

Fonte: Carlos Drummond de Andrade, 1902 – 1987

A Palavra mágica / 13ªed. Rio de Janeiro – São Paulo

- pág 43 / Record. 2007




Nenhum comentário:

Postar um comentário