A devastação provocada pelo Tufão
Haiyan nas Filipinas revela a urgência no combate às mudanças climáticas
MARCELO
MOURA
23/11/2013
10h00
DEVASTAÇÃO
Morador caminha sobre destroços em Tacloban. O Haiyan destruiu 90% da cidade,
com ventos de mais de 300 km/h (Foto: Erik De Castro/Reuters)
"Saquear não é crime, é autopreservação.” A frase do prefeito de
Tacloban, Tecson John Lim, dá a medida do horror que se instalou nas Filipinas após a passagem do Tufão Haiyan (ou Iolanda), no sábado, dia 9. O odor de
cadáveres em decomposição dominava o ar do município de 200 mil habitantes, na
costa do Sudeste Asiático, dias depois que ventos vindos do Oceano Pacífico, a
mais de 300 quilômetros por hora, varreram 90% da cidade. As palavras de Lim
expunham o desespero de moradores que saíram em busca de suprimentos básicos,
como água e remédios, numa cidade onde muitos comerciantes e donos de casas
invadidas morreram na tragédia. Inicialmente, as autoridades estimaram em 10 mil os mortos no país. Dias depois, o presidente Benigno Aquino
reduziu a previsão para 2.500. Cerca de 620 mil pessoas ficaram desabrigadas.
Longe dali, na conferência sobre o clima (COP-10) da Organização das Nações
Unidas (ONU), em Varsóvia, na Polônia, já era apontado um culpado: o ser
humano. Yeb Sano, negociador-chefe filipino, implorou por mais iniciativas dos
países ricos contra as mudanças climáticas. “Falo pelas incontáveis pessoas que
não poderão mais falar”, disse, em meio a lágrimas. “O que meu país enfrenta,
como consequência desse evento climático extremo, é uma loucura. A crise no
clima é uma loucura.”
É impossível afirmar, categoricamente, que a tragédia do Haiyan seja
consequência direta das mudanças no clima da Terra. Os tufões formados no
Pacífico são menos estudados que os furacões do Atlântico. As Filipinas
investem pouco na compreensão de fenômenos naturais. O último voo de estudo de
tufões naquela região foi promovido há três décadas, pelos Estados Unidos. Pesquisas realizadas em outras áreas do planeta
permitem dizer que as temperaturas mais altas no planeta são, sim, capazes de
agravar tragédias como a das Filipinas. Tufões, furacões e ciclones são tempestades
formadas por áreas de baixa pressão atmosférica sobre regiões aquecidas dos
oceanos. A frequência dessas tempestades não aumentou nas últimas décadas – de
janeiro a setembro deste ano, foram 23 no nordeste do Pacífico. A fúria do
fenômeno, sim, já que nas últimas décadas os oceanos se aqueceram. “Oceanos
mais quentes dão mais energia a essas tempestades e as tornam mais
intensas”, diz Colin Price, diretor do Departamento de Ciências Geofísicas,
Atmosféricas e Planetárias da Universidade de Tel Aviv, em Israel.
O último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU
(IPCC, na sigla em inglês) afirma que a alta do nível do mar, resultado do
derretimento de calotas polares, aumenta as chances de inundações e fortes
tempestades. Com mais água nos oceanos, um fenômeno como o Haiyan se torna mais
destruidor para populações costeiras – grande parte da devastação em Tacloban
foi causada pela água do mar, como um tsunami. “É prematuro dizer que o Haiyan
tenha sido fruto da ação humana”, diz Thomas Knutson, pesquisador-chefe de
impactos no clima da Agência Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos
(Noaa). “Mas nossos estudos sugerem que até o fim do século o aquecimento global
deverá aumentar a incidência de furacões entre 2% e 11%.”
O consultor Robert Bea, mestre em prevenção de desastres e professor emérito da
Universidade Berkeley, alerta para o atual despreparo de muitas cidades
costeiras. “Os pioneiros das Filipinas construíam em regiões ‘altas e fortes’
para evitar os efeitos dos tufões”, afirma Bea, sobre uma prática abandonada
com o tempo. Os antigos filipinos sabiam que a fúria da natureza é
incontrolável. Se ela tende a aumentar, como creem os cientistas, combater o
aquecimento do planeta é imperativo. Ainda mais urgente é proteger as
populações que vivem no caminho da destruição.
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