A ex-ministra, ex-prefeita de São Paulo e senadora
anuncia sua saída do partido que ajudou a construir e diz que a cúpula petista
não tem mais outro projeto senão o de se manter no poder
Por: Pedro Dias Leite24/04/2015 às 23:14 - Atualizado em 24/04/2015 às 23:14
"Marta
Suplicy: O PT se distanciou dos seus princípios éticos, das suas bases e de
seus ideais"(Luiz Maximiano/VEJA)
Marta Suplicy foi deputada, prefeita de São Paulo, ministra do Turismo,
da Cultura e atualmente cumpre mandato de senadora. Sempre pelo PT, partido em
que milita desde o início da década de 80. Trinta e cinco anos, de muitas
vitórias e algumas derrotas, um mensalão e um petrolão depois, que descreve
como uma "avalanche de corrupção", ela decidiu deixar a legenda a que
dedicou metade de sua vida. Marta tem convite de quase todos os partidos
políticos do Brasil, mas se inclina mais para o PSB de Eduardo Campos, o
candidato morto em um desastre de avião na campanha presidencial do ano
passado. Enquanto desenhava estrelinhas em uma folha de papel, Marta falou a
VEJA de seus motivos para romper com o PT e de seu "projeto de
nação".
A senhora saiu do PT ou o PT a deixou antes? Tenho muito orgulho de ter ajudado a fundar o PT. Acreditei, me envolvi,
trabalhei décadas, com dedicação total. Saio do PT porque, simplesmente, não é
o partido que ajudei a criar. O PT se distanciou dos seus princípios éticos,
das suas bases e de seus ideais. Dessa forma traiu milhões de eleitores e
simpatizantes. Eu sou mais uma entre as pessoas que se decepcionaram com o PT e
não enxergam a possibilidade de o partido retomar sua essência. Respondendo a
sua pergunta, estou segura de que meus princípios nunca mudaram, são os mesmos
da fundação do PT, os mesmos com os quais criei os meus três filhos. Agora
tenho um desafio, o desafio do novo. Quero ter um projeto para o meu país. Um
projeto em que acredite. É isso que eu vou buscar.
O que mais pesou na sua decisão? O componente ético é muito forte. A decepção foi tremenda. Não foi fácil
ver os integrantes da cúpula do partido na prisão. Discordo da maneira pública
pela qual eles foram julgados e sentenciados. O processo judicial pode ter sido
perfeito, mas a humilhação pública que eles sofreram não se justifica. Por essa
razão eu não me manifestei durante o julgamento do mensalão. Mas senti que
havia um profundo distanciamento do que nós, petistas, queríamos para o Brasil.
Reconheço o muito que já se fez em termos de diminuição da pobreza e do aumento
da mobilidade social. Mas eu percebo também que a cúpula se fechou e, cercada
por interesses corporativistas de certos movimentos sociais e sindicalistas, trabalha
apenas para se manter no poder. O PT não tem mais projeto para o Brasil. Se não
recuperar seus princípios éticos, da fundação, não voltar às suas bases, se
ficar só no corporativismo, o PT vai virar uma pequena agremiação. Teria chance
se fosse no caminho oposto, mantendo sua base social, mas incorporando uma
classe média que ele mesmo ajudou a criar. Mas, se você perguntar se o PT fará
o que é preciso para se salvar, minha é resposta é não.
Houve uma gota d'água? A escolha do Fernando Haddad para ser candidato à prefeitura de São
Paulo, em 2012, foi muito difícil para mim. Mas respirei fundo e fiz campanha
para ele. Sei que minha participação foi fundamental para a vitória do Haddad.
Antes já tinha sido praticamente abandonada na minha eleição para o Senado.
Ganhei com enorme dificuldade. O PT fez campanha muito mais forte para o
candidato Netinho do que para mim. Então comecei a pensar no que estava fazendo
no PT. Em 2014, meu nome nem foi cogitado para a corrida ao governo de São
Paulo, embora eu tivesse 30% das intenções de voto. Aí vem essa avalanche de
corrupção. Engoli muita coisa na política. Mas, quando vi que estava em um
partido que não tem mais nada a ver comigo, que não luta pelas bandeiras pelas
quais eu me bati e que ainda me tolhe as possibilidades - e eu sei que sou boa
-, a decisão de sair ficou fácil.
A senhora não viu os sinais da "avalanche de
corrupção" no PT? Não, porque eu nunca participei
disso. Não tinha a mais leve ideia. Como a maioria dos petistas não tinha
também. Se você não estava ali naquela meia dúzia, você não sabia.
Quando ficou evidente sua saída, a máquina de
destruição de reputações do partido começou a agir com a acusação de que a
senhora, uma aristocrata, nunca foi realmente do PT. Isso magoa?Essas pessoas nunca estiveram na minha pele. Dei ao PT uma cara de
classe média palatável. Isso abriu outro horizonte, com a adesão de uma classe
média que não se identificava com o sindicalismo. Se não posso dizer que a
inventei, tenho certeza de que contribuí muito para a modernidade do PT. Esse
tipo de crítica não me afeta.
A senhora teve um papel de destaque no "Volta,
Lula", movimento para afastar Dilma e lançar como candidato o
ex-presidente. Por quê? Eu tinha certeza de que, se a
Dilma vencesse, teria um segundo mandato muito difícil, como está sendo
efetivamente. Achava que com o Lula teríamos condição de rever com clareza os
erros cometidos e, assim, reunir força política para tirar o Brasil daquela
situação. A maioria dos deputados e dos senadores preferia a candidatura do
Lula pelas mesmas razões que as minhas. Eles só foram mais cuidadosos.
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