A história da corrupção vem de muito longe. Basta lembrar os capítulos 6 e 25 do Livro do Gênesis. Na primeira referência a palavra corrupção apresenta um sentido amplo, de decadência da humanidade toda. Na segunda, remete a dois personagens: Esaú e Jacó; o segundo assumindo o lugar do primeiro. Por aí já se percebe que a corrupção, tanto em sentido mais amplo quanto mais estrito, parece ser inerente à condição humana. Com isso não nos surpreende que em nossos dias, ao se falar de apropriação indébita de bens, haja uma espécie de índice que aponta os países menos e os mais corruptos. A Dinamarca estaria em primeiro lugar em termos de transparência, enquanto que a Somália e a Coreia do Norte estariam em último lugar. O Brasil ocuparia o 69º lugar, posição nada honrosa. Não obstante, apesar dos escândalos ligados à Petrobras e outros que os antecederam estarem no foco das denúncias, preferimos ficar num plano mais genérico, não nos restringindo ao nosso país.
Aqui não iremos recorrer ao denominado pecado original, expressão de decadência humana. O que importa é nos situarmos no plano histórico e nos perguntarmos não apenas pelas raízes mais profundas, mas também pelos expedientes mais importantes para fugir da corrupção. Primeiramente podemos citar a cobiça, que nos parece ser apenas uma amostra do que leva os seres humanos à corrupção, sobretudo em sentido econômico. Entrando um pouco mais no coração humano nos deparamos com a sede de poder. Se é verdade que todo poder tende a corromper, com certeza “o poder absoluto corrompe absolutamente”. Ou seja, no cerne de um cortejo de causas que se reforçam mutuamente se encontra a sede de poder. Nesse particular é muito ilustrativo lembrar a tentação dos primeiros seres humanos: “sereis como deuses”. Eis aí a raiz mais profunda de todos os males: querer ocupar o lugar de Deus, deixando de se reconhecer como criatura.
Se assim é, o caminho para vencer, ou ao menos diminuir significativamente a corrupção, já está se delineando. Antes de mais nada, de uma forma ou de outra, a tomada de consciência por parte de todos de que somos criaturas se torna indispensável. É que essa consciência se abre para outra: a de que ninguém poderá usufruir do poder e da riqueza por muitos anos; mais cedo ou mais tarde todos seguirão o mesmo destino. Logo em seguida emerge um outro delineamento: o de que a democracia não pode ser uma palavra vazia. Onde há verdadeira democracia há eficientes mecanismos de controle e verdadeira participação do povo, pressupostamente consciente, pois ele é o autêntico detentor de poder. Traduzindo: uma das raízes históricas mais profundas da corrupção encontra-se na concentração do poder. Daí nunca ser demais recordar a existência de ao menos três poderes: o legislativo, o judiciário e o executivo.
Pressupõe-se que eles devam lutar por sua autonomia. E se formos um pouco mais adiante veremos que a instalação desses três poderes num único lugar geográfico já se configura a primeira ameaça. Descentralizar parece ser um dos grandes segredos dos bons governos. Entre outros, destacam-se dois casos nos quais se percebe a força dos mecanismos de descentralização: Estados Unidos e Grã-Bretanha. Sem deixar de existir um ponto de referência e uma comunhão de ideais, isto se concretiza em Federação, e numa Federação os Estados podem assumir posturas próprias, ao lado daquelas que constituem os grandes eixos da nação. Também é significativo o que está ocorrendo na Igreja Católica com o Papa Francisco. Logo no início de seu pontificado ele retomou uma linguagem antiga para expressar uma nova maneira de exercer seu ministério: bispo de Roma. E onde fica o Primado? Na caridade e no que realmente traduz o cerne da fé cristã, que deve ser vivida por toda a Igreja e em todos os lugares. É por meio dessa descentralização que a Igreja vai assumindo um novo rosto: mais sorridente, mais democrático no sentido profundo da palavra. E finalmente, somente por meio da descentralização se faz possível a transparência, verdadeiro escudo contra a corrupção.
Frei Antonio Moser, OFM
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